A música dialoga fundo comigo. Sempre me acompanhou, desde a adolescência. O som do meu quarto de filha única preenchia os espaços tão cheios de dúvidas quando a minha vida adulta começava a se esboçar. Quando o walkman surgiu, os fones se tornaram meu mundo particular, onde mergulhava e processava os sentimentos tantas vezes confusos, as ansiedades sobre o futuro, tão intensas quando somos jovens. Escolhi escrever sobre canções de protesto em minha Monografia de faculdade de Comunicação Social, quando, idealista, me debrucei fascinada pelas conotações políticas da luta contra a censura nas letras de MPB. Era uma história que pertencia a uma geração antes da minha, mas influenciou demais os nascidos na década de 70, como eu.
Anos depois, no Mestrado, li Obra Aberta, de Umberto Eco, entre outros livros que analisam o que é chamado por alguns de Teoria da Recepção. Simplificando e resumindo muito, a ideia é que os conteúdos artísticos são ressignificados por cada um que os recebe, de acordo com suas referências, opiniões, história de vida, maneira de olhar o mundo. É claro que existiu uma intenção do autor no momento em que produziu a obra, mas a partir do momento em que ela está à disposição do público, cada um as interpreta de sua maneira.
Entendo porque me identifiquei tanto quando ouvi pela primeira vez os Titãs cantando: “O acaso vai me proteger enquanto eu andar distraído”. Aqui em Tóquio, mergulho novamente nas minhas músicas. Os fones de ouvido estão sempre comigo, e essa cidade extremamente segura me permite andar pelas ruas enquanto viajo nas letras e interpretações. Zizi Possi cantando Disparada, de Geraldo Vandré. Ney Matogrosso cantando Roda Viva, de Chico Buarque… A mágica para mim é que cada música fala de maneira diferente com quem as está ouvindo, como cada quadro, cada livro, cada obra aberta.
Obrigada, música brasileira!
Gonzaguinha:
“Eu vou à luta é com essa juventude, que não foge da raia a troco de nada.// Eu vou no bloco dessa mocidade, que não tá na saudade e constrói a manhã desejada.// Aquele que sabe que é negro o coro da gente, que segura a batida da vida o ano inteiro.// Aquele que sabe o sufoco de um jogo tão duro e apesar dos pesares ainda se orgulha de ser brasileiro”.
Legião:
“Quem me dera ao menos uma vez explicar o que ninguém consegue entender, que o que aconteceu ainda está por vir e o futuro não é mais como era antigamente.// Quem me dera ao menos uma vez provar que quem tem mais do que precisa ter quase sempre se convence que não tem o bastante e fala demais por não ter nada a dizer”.
Chico Buarque:
“Vai meu irmão, pega esse avião, você tem razão de correr assim desse frio mas beija o meu Rio de Janeiro antes que um aventureiro lance mão…// Vê como é que anda aquela vida à toa e se puder me manda uma notícia boa”.
Tem dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu. Quer definição melhor da alma humana? Adorei o post
Lindo tema! Gostei muito! Me provocou à reflexão. Pena que não podemos mandar “notícia boa”. Isso aqui está um lixo só. Beijos a todos vocês.
Achei bem interessante esse post pois tbm sou fascinada pela música durmo e acordo ouvindo música. Rádio gosto muito da rádio nova Brasil fm. Que é somente mpb. quando adolescente. Sempre ouvia música japonesa a música japonesa o Enka . Os sons do shamisen. Sempre estiveram comigo. E agora vivendo aqui. Estou sempre com mpb
nao sou da década de 70. Um pouco depois. Mais sou fã de Raul Zé ramalho. E Alceu Valença. Sem falar no eterno legião.
E tantos outros que me acompanham e me inspiram parabéns pelo post e pelo blog.
Gostei!
Realmente as músicas tem esse poder sobre a gente.
Que bom que voltou a publicar.