Convivência

A foto que ilustra esse post é de uma estátua solitária na beira de uma praia na ilha de Naoshima. Reparem nas moedas em seus pés. Algumas eram de 100 ienes, o equivalente a um dólar. Estão lá, intactas. Não há possibilidade de alguém roubar essas moedas.

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Convivência é arte de viver junto com os outros e com o ambiente que nos cerca. Uma palavra com um potencial infinito de ampliação de sentido e que deve permear todas as nossas ações. A vida no Japão me ensina muito sobre como aplicar esse valor, um valor fundamental.

Para uma metrópole ser compartilhada ao invés de disputada o primeiro e óbvio ingrediente é ela contar com uma estrutura que sirva a todos. Já escrevi bastante por aqui sobre o perfeito sistema de transporte público japonês. Mas não é só a existência dos trens, metrôs e ônibus integrados que faz a circulação aqui ser impecável. Conta muito também o comportamento de cada um, regido sempre pelo respeito. Respeito ao outro, respeito ao espaço público. Convivência.

Os japoneses cuidam das praças, estações, calçadas, parques e trens como cuidam das suas próprias casas. Ou melhor ainda. Porque é até aceitável que dentro de casa esteja uma bagunça, não estou incomodando ninguém com isso. Mas o espaço compartilhado com os outros é de responsabilidade de todos. Deve estar sempre impecável. Convivência.

Observo as conversas entre os japoneses e o que mais me chama a atenção é a preocupação em mostrar com a linguagem corporal e expressões verbais o quanto estão interessados no que o outro está falando. Para um estrangeiro chega a ser engraçado. Mas me faz pensar que nós ocidentais damos um valor exagerado para a fala em detrimento da escuta. Pense bem: quantas vezes, ao conversar com alguém, ao invés de prestar total atenção ao que o outro está falando, você já estava em sua cabeça elaborando sua resposta? E nas redes sociais então? Muita gente nem lê os posts dos outros inteiramente, o mais importante é comentar, marcar posição. Valorizar o ato de escutar é fundamental para a convivência.

Aqui também aprendi a conviver muito melhor comigo mesma. O Japão tem um silêncio que vem da falta do stress que nos consome tanto no Brasil, aquele que descrevi em A liberdade da andar distraída. Aqui consegui olhar para dentro e desatar muitos nós do passado. Ao conviver melhor comigo, a minha convivência com os outros melhorou muito. A menina tímida da minha infância que tanto me atrapalhou na adolescência e na vida adulta, finalmente se dissolveu. Consegui me abrir para o outro, fazer amigos de culturas diferentes da minha, e assim exercitar ainda mais a arte de escutar e aprender. Convivência.

Convivência comigo, convivência com o outro, convivência com a cidade, convivência com a natureza. Convivência regada de respeito. A receita é simples e mágica.