Somos todos responsáveis

Fui com meu marido e minha filha passear no zoológico em um domingo de fim de inverno aqui em Tóquio. Isabel nos guiou, estudando o mapa e nos levando para ver os gorilas. E eu, mãe orgulhosa, me dava conta de como ela está crescendo rápido. Um passeio simples me permitiu admirar e aproveitar a minha menina, consciente de que daqui a pouco ela não estará mais assim.

Foi quando o meu foco mudou. Comecei a olhar para os animais, a olhar dentro dos olhos deles. Fui ficando terrivelmente incomodada, desconfortável. Senti empatia e pena, muita pena. Pensei que daqui a um ou dois séculos, talvez a humanidade veja este momento do passado como hoje vemos a Idade Média. Animais presos, tristes, transformados em objetos que servem para a diversão de famílias em um domingo de fim de inverno. Comecei a viajar em meus pensamentos e constatei que se isso acontecer será maravilhoso. Teremos evoluído. Mas existe um outro cenário. Daqui a um ou dois séculos, pode ser que muitos desses animais estejam extintos e que os homens olhem para trás com admiração, pensando que naquela época ainda existiam bichos exóticos como o rinoceronte.

Ufa. Chega a ser assustador, mas tenho cada vez mais consciência de que esse momento da história da humanidade é crucial para o futuro. Sinto que estamos em uma encruzilhada. A direção que tomarmos agora pode ser determinante para tudo o que virá pela frente e isso impõe a nossa geração uma imensa responsabilidade.

Vocês já devem ter ouvido ou falado muito (como eu) a seguinte frase: o importante na vida é ser feliz. Pois estou me tocando do quanto essa frase é egoísta. Ela está embebida de valores alimentados pelo individualismo ocidental que nos empurra a querer sempre mais e melhor. Entrando no supermercado, minha filha me pergunta: “mãe, não seria maravilhoso se tudo fosse de graça? A gente ia poder levar tudo para casa”. Consciente da importância da resposta que daria a ela, pensei por alguns momentos e respondi: “A riqueza do mundo é limitada, filha. Não é possível termos demais, porque se isso acontecer, outras pessoas irão ter de menos”. Ela entendeu na hora.

A mensagem que tento passar para os meus filhos e que tento adotar na minha vida não é “o importante é ser feliz”. Busco mostrar para eles o quanto são privilegiados por estudar em uma escola maravilhosa e estarem morando no outro lado do mundo, conhecendo outras maneiras de viver, aprendendo com o diferente. Depois dessa experiência, eles tem a obrigação de contribuir para a construção de um mundo melhor. Essa frase “construir um mundo melhor” já foi escrita e falada tantas vezes, mas será que prestamos realmente atenção ao que ela significa?

Todos nós somos responsáveis pelo caminho que a humanidade vai trilhar a partir dessa encruzilhada. Normalmente pensamos em nossas ações até o momento em que elas deixam de nos afetar, mas elas não terminam ali. Se eu quebrei um copo na cozinha, o que faço? Jogo no lixo e esqueço do problema. Depois dessa ação, o vidro quebrado continua a existir, e pode cortar a mão do lixeiro. Aqui no meu prédio, na salinha de lixo existe uma caixa vermelha com a mensagem: “embrulhar os vidros quebrados em um papel e escrever Perigo”. É óbvio que é isso que deve ser feito, e o fato de precisar haver um recado para orientar a pessoa a agir corretamente é um sintoma da nossa doença.

Um saco plástico pode matar um golfinho, o óleo derramado no ralo da pia pode entupir encanamentos e contribuir para uma enchente. O individualismo nos leva a ignorar as consequências dos nossos atos e é ele que alimenta aberrações que são o ápice dessa montanha de pequenas ações inconsequentes.

Para seguirmos na direção certa, é preciso enxergar que nossos atos têm consequências que vão muito além da nossa zona de conforto e da fantasia de que o importante é ser feliz.

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